Resenha: Casa Gucci
“Casa Gucci” (House of Gucci) tenta focar na relação de Patrizia Regianni e Maurizio Gucci, do auge ao fim do casamento, interpretados por Lady Gaga e Adam Driver. Nos intervalos do relacionamento conturbado, o filme cerca as desventuras da família milionária: O tio Aldo (Al Pacino, de “O Advogado do diabo”), seu filho Paolo (Jared Leto, “Réquiem para um Sonho”) e os escudeiros de cada lado, como Domenico (Jack Huston, de “Ben-Hur”) e a vidente Pina (Salma Hayek, de “Eternos”).
Caracterização interessante com sotaque caricato
O trabalho técnico do filme tem seu valor por descaracterizar os atores com rostos muito conhecios do público. O que foi feito com Jared Leto pra interpretar Paolo Gucci, um homem calvo e de um porte físico maior que o de Leto, fica bem feito. O mesmo se pode dizer do Aldo de Al Pacino, enrugado e atrás de uma feição com muitos anos a mais que o ator. Mesmo com Adam Driver, que não tem uma maquiagem tão densa, ainda se pode ver traços do Maurizio Gucci nele.
Mas é importante ressaltar: A “descaracterização” dos atores não reflete necessariamente em igualdade com os retratados. O personagem de Leto não lembra exatamente o Paolo original, mas trabalha mais de forma caricata os envolvidos, tentando fazer o que “Eu, Tonya” fez, mas aqui numa pegada mais séria que o filme de 2017 com Margot Robbie. Lá a brincadeira vale a pena, aqui nem tanto.
Aí nessa forçação de barra em fazer uma caricatura, os tons de vozes entram numa loucura de sotaques italianos forçados, que beiram uma novela das 8. E todo mundo entra no jogo, do californiano Adam Driver até chegar aos atores que tem descendência italiana de fato, como Lady Gaga e Al Pacino, tudo muito carregado desnecessariamente. Pode parecer pedante uma opinião falando de sotaque, eu sei, mas quando até uma atriz mexicana como Salma Hayek precisa entrar no jogo, a coisa nem fica definida como drama nem como caricatura.
Roteiro arrastado
A adaptação do livro para o cinema é assinada por Becky Johnston, uma mulher que está acostumada a adaptar histórias longas como “Sete Anos no Tibet” (1997) e “O príncipe das Marés” (1991). Mesmo com esta experiência, o andar do filme não consegue ser salvo.
“Casa Gucci” ( que vem de um livro de Sara Gay Forden) tem um problema de identidade na história que quer contar. Ele não se decide se deseja mostrar um casamento polêmico, uma família problemática ou um jogo de poder pelo dinheiro. Na dúvida, Ridley Scott mandou os três para a tela, este mesmo Ridley Scott que criticou meses atrás os roteiros de filmes de herói por não ter roteiros bons. Seu “Casa Gucci” é um filme que se arrasta, puxado de assistir, com tudo e nada acontecendo ao mesmo tempo.
A vantagem dele é contar com Lady Gaga, que carrega o filme nas costas com sua atuação de uma mulher manipuladora e controversa, independentemente de ser a verdade dos fatos ou não. Mas mesmo nesta visão da vilã o filme sofre: Ora, quando o filme deveria deslanchar para motivações, interesses ou intrigas… ELE ACABA. Assim, sem mais nem menos, só porque tem de acabar, como uma novela que chegou no nono mês sem audiência.
Vai pro Oscar?
Apelando para a caracterização nos anos 60, 70 e 80, é bem provável que o filme seja indicado e ganhe algo na premiação. Assim como existem chances de Lady Gaga ser indicada para sua segunda estatueta, já que ela é o motor que faz o filme girar. Mas, colocando em perspectiva com “Spencer”, por exemplo, temos um espelho invertido do que é a atuação: Em “Spencer” temos uma Kristen Stewart que tem limitações mas conta com a mão do diretor pra ter a agonia sutil de ser a princesa Diana, enquanto em “Casa Gucci” encontramos uma Lady Gaga solta num personagem, mas de mãos atadas em umas história chata que o diretor parece não ter feito nenhuma intervenção. “Spencer” tem um time. “Casa Gucci” tem só seus nomes. “Spencer” tem um roteiro e uma proposta. “Casa Gucci” só lança fatos na tela, correndo o risco de tornar a história uma coisa passível, modorrenta e por vezes até misógina (e veja que estamos falando de uma mulher que assassinou o marido).
Como a academia toma emprestado o prestígio de seus nomeados, “Casa Gucci” deve até aparecer pela cerimônia, visto a quantidade de grandes nomes que possui. Mas pra nós, espectadores, no fim das contas já sabemos que só nome grande não leva nenhuma time ao título, mesmo que seja o nome de um dos maiores expoentes da moda.