Resenha: A Noite das Bruxas
Ta aí uma franquia que, embora de forma muito discreta, continua a persistir. Chegamos ao terceiro filme dos livros de Agatha Christie, A Noite das Bruxas (A Haunting at Venice). E, das três adaptações esta é, de longe, a melhor de todas.
Por muita sorte conseguimos assistí-la pois, se dependesse do rendimento do 2º filme, eu diria que este não veria a luz do dia. Nada contra a direção de Kenneth Branagh, que também atua no papel principal. Mas nada ali funciona.
Nem as caras e bocas de Gal Gadot (sempre a achei muito fraca, mesmo para Mulher-Maravilha) foram capazes de tornar Morte no Nilo um filme agradável. Sorte que ele rendeu muito bem no streaming (aqui pode ser visto no Star+), o que permitiu um sinal verde para esta sequência.
Uma ótima história de detetive
Aqui vemos o famoso detetive Poirot (Branagh) isolado na Veneza pós 2ª Guerra. Evitando novos casos e tentando levar uma vida pacata. Até que é convidado por uma antiga amiga, a escritora Ariadne Oliver (Tina Fey, de Only Murders in the Building. Que parece muito que é a própria escritora, Agatha Christie, se inserindo na história) o convida para uma festa de Halloween na casa de uma cantora de ópera, Rowena Drake (Kelly Reilly, de Yellowstone e O Vôo), onde ela pretende desmascarar uma vidente (Michelle Yeoh, atual vencedora do Oscar de Melhor Atriz por Tudo em Todo o Lugar ao Mesmo Tempo) que irá realizar uma sessão espírita para falar com o espírito da filha morta da cantora.
Durante a festa conhecemos os outros personagens: o médico Ferrier (Jamie Dornan, repetindo a parceria com Branagh de Belfast, Robin Hood – A Origem e da trilogia 50 Tons de Cinza) e seu filho Leopold (Jude Hill, também de Belfast), a governanta da casa, Olga (Camille Cotin, de Stillwater), o ex pretendente da falecida filha, Maxime (Kyle Allen), e o segurança de Poirot, Vitale Portfolio (Riccardo Scamarcio, de John Wick 2: Um Novo dia para Morrer).
Durante a noite acontece um novo assassinato na mansão. O palco está preparado, as peças estão prontas. Cabe a Poirot se retirar do seu auto exílio e resolver o mistério.
Mistério com pitadas de terror
Diferente dos dois filmes anteriores, Branagh se aproveita da arquitetura bizantina, gótica e renascentista da cidade italiana para dar um clima sobrenatural à trama. Tudo isso é acentuado pela sensação de mistério, sombras e o terror da situação.
Além disso o próprio cenário já ajuda por si só. Ironicamente, Poirot escolhe ter seu exílio em Veneza, uma cidade que aos poucos está afundando. Podemos até dizer que reflete o estado mental do personagem. O que torna a sua volta ao jogo ainda mais relacionável, e muito mais fácil para nós torcemos por ele. Queremos que ele o detetive belga supere suas atuais dificuldades e elucide o mistério.
Que acaba tornando a cidade o cenário perfeito para o conto, e Branagh a filma de forma a aproveitar essa beleza que parece que parou no tempo. Tanto nas tomadas aéreas quanto nas mais fechadas da mansão onde se passa a maior parte do filme.
Branagh também usa e abusa do chamado ângulo holandês. Sua câmera sempre está em posições e enquadramentos fora do normal, propositalmente causando um interessante desconforto ao espectador. Funciona perfeitamente com o cenário que, embora seja uma mansão, acaba passando uma sensação de claustrofobia na audiência.
Elenco afiado
O elenco está no ponto certo. Até mesmo Branagh, que achei meio exagerado no segundo filme, aqui está mais comedido, talvez pela situação em que o personagem se encontra. Tina Fey tem bons momentos como a escritora Ariadne, mesmo que ela tenha mais jeito para a comédia do que para o drama.
É ótimo ver Michelle Yeoh em papéis que não envolvam ela chutando e socando, um simples papel onde ela desafia as crenças do protagonista (ou a fala delas). Jamie Dornan está mais comedido, mas ele tem um papel pequeno, quase imperceptível. Diferente de Jude Hill, que se destaca bastante e possui ótimos momentos. A criança promete.
Para mim é um páreo duro, esse poderia muito bem ser o melhor elenco dos 3 filmes. Mas a falta de um grande nome (ou um nome mais popular, como um Johnny Depp, um Willem Dafoe e uma Michelle Pfeiffer em Assassinato no Expresso do Oriente e Gal Gadot e Armie Hammer na sequência) talvez tenha dado menos força a esse filme.
Mas todos estão na medida certa, cada um defendendo as motivações dos seus personagens de forma muito convincente.
Vale a pena assistir A Noite das Bruxas?
Se você gostar de filmes de detetive e mistério (popularmente chamado nos EUA como “whodunnit”, quem matou) este filme é para você. É perfeito, te engaja, te mantém preso na cadeira até o final onde tudo é revelado de modo muito satisfatório.
E a sala escura do cinema aumenta ainda mais o clima de terror e mistério, graças aos cenários por vezes claustrofóbicos e extremamente sombrios. Com A Noite das Bruxas, Branagh conseguiu tirar da minha boca o senso de filme ruim que Morte no Nilo havia deixado. Não prometeu nada e entregou tudo.