Resenha: Onde fica o Paraíso
Quantas vezes você já se perguntou o que há depois da morte? Por vários momentos, “Onde Fica o Paraíso” cita vários mitos, lendas, crenças e pensamentos que muitas pessoas acreditam sobre esse assunto. Porém, o que o filme realmente mostra é que a parte mais importante é o que nós fazemos durante a vida. Ou seja, a pergunta certa não é se existe paraíso ou summerland, e sim: “como estou vivendo hoje?”, “Quem estou sendo hoje?”.
Escrito e dirigido por Jessica Swale, “Onde Fica o Paraíso” conta a história de Alice (Gemma Arterton), uma pesquisadora solitária e reclusa que vive em um pequeno vilarejo. Sua vida muda completamente quando, durante a invasão nazista ao Reino Unido na Segunda Guerra Mundial, um garoto chamado Frank (Lucas Bond) é colocado sob seus cuidados para fugir dos bombardeios em Londres.
A história da protagonista e dos coadjuvantes se cruzam de uma forma esperável, porém não deixa de ser emocionante e linda. Isso ocorre por conta dos diversos flashbacks ao longo do filme proporcionam uma boa contextualização para a história e reforça essa previsibilidade.
Por meio do estilo narrativo escolhido para o longa, com os vários flashbacks, é uma técnica presente em filmes muitos conhecidos, como “A Chegada” (2016), de Denis Villeneuve, e “O Esquadrão Suicida” (2021), de James Gunn, e consegue guiar e mudar o olhar do espectador, quando há um bom roteiro. No caso de “Onde Fica o Paraíso” foi possível entender cada sentimento e comportamento da protagonista ao longo de cada cena. Diferente do filme “A Chegada”, as idas e vindas na linha do tempo não confundem o espectador, ao contrário guia o tempo todo para o plot twist simples, romântico e, como já citado, previsível.
À medida que entendemos que previsibilidade não é algo negativo, conseguimos ver a beleza no filme. Assim, podemos concluir que um roteiro previsível não é algo ruim quando está acompanhado por um conjunto da obra bem feito, como uma boa direção, atuação, fotografia, montagem e todas as outras funções envolvidas para fazer o filme.
Esses flashbacks aliados com as ações dos personagens despertam em Alice lembranças do passado que estavam enterradas. Passado esse que mostra um relacionamento homossexual em uma época muito mais complicada, onde as pessoas eram perseguidas por ser quem elas eram e amar quem eles amavam.
Além disso, é importante notarmos como uma mulher estudiosa e determinada, se torna reclusa e arrisca, por conta do estereótipo de ser uma bruxa. Após a partida de Vera (Gugu Mbatha-Raw), companheira de Alice, a pesquisadora se isolou e focou 100% nos seus estudos e na profissão. Assim, virando chacota dos vizinhos e alvo de garotos mal educados e preconceituosos, isso por fugir da regra de ser uma mulher que segue o padrão social imposto, principalmente na década de 40.
Outrossim, é a forma que foi abordado e naturalizado a maternidade como uma opção. Mesmo que seja doloroso a forma que Vera escolheu deixar Alice para ser mãe, podemos entender que a maternidade pode ser sim uma escolha. Alice não queria ter filhos e mesmo sofrendo por não ter sua namorada ao seu lado, preferiu seguir a vida sozinha do que em uma situação que não queria vivenciar naquele momento.
Em conjunto com a trama envolvente, as atuações das atrizes Gugu Mbatha-Raw (“The Morning Show”) e Gemma Arterton (“Príncipe da Pérsia: As Areias do Tempo”) estão excelentes. Elas conseguem colocar todos os seus talentos em cada cena, principalmente nas cenas juntas dos flashbacks.
A trama também contou com um figurino e uma direção de arte pensada com muito zelo, pois as cores fazem toda a diferença, mesmo que de uma forma sutil. Diferente de “O Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças” (2004), de Michel Gondry, onde as cores tomam muito de nossa atenção, aqui as cores completam a história de forma singela, dizendo muito mais do que percebemos. Cores dos cenários e roupas das atrizes e das crianças.
Por exemplo, as roupas e objetos da Vera são em cores quentes e chamativas, mostrando sua personalidade forte e alegre. Diferente de Alice, que tem uma personalidade mais introspectiva e utiliza roupas com cores neutras como bege cinza. Porém, nos dois casos, as cores mudam com o tempo e acontecimentos. Quando Frank vai morar com Alice, ele transforma a forma que ela se abre com as pessoas ao redor e cores como azul claro, verde e laranja são colocados de forma delicada, nas faixas de cabelo e vestimentas. Com Vera, conseguimos ver quando ela reaparece de luto em cores escuras, porém ainda com roupas no seu estilo único.
Para finalizar, precisamos ressaltar as lindas e deslumbrantes vistas costeiras e aldeias de Sussex que estiveram presentes nas cenas do longa. Lembrando muito as paisagens do filme “Enquanto houver amor” (2021), de William Nicholson.
“Onde Fica o Paraíso” teve sua estreia no dia 26 de novembro e está disponível para compra e aluguel em plataformas digitais.