Resenha: Parasita
Aproveitando a lista dos indicados ao Oscar nossa colaboradora Juliana Negri fez esse texto bem legal sobre o filme sul-coreano “Parasita”.
Juliana é profissional da área do entretenimento, formada em jornalismo, atua como produtora e professora da área de comunicação para a música e showbusiness, viciada em séries, filmes e documentários, nerd de carteirinha, fã do Spock, do Iron Maiden e devoradora de livros. Confiram e aproveitem a leitura:
Essa semana, após as seis indicações ao Oscar, “Parasita” ganhou ainda mais projeção entre os espectadores que adoram maratonar os filmes indicados. O filme chamou minha atenção ao vencer a categoria de melhor filme estrangeiro no Globo de Ouro.
A obra do diretor sul-coreano Bong Joon-Ho conta a história da família Ki-taek, vivendo um período de crise extrema, com desemprego e pouquíssimos recursos, morando em um local insólito, e da família Park, que vive no luxo, em meio a empregados e filhos mimados. Bong traça uma série de paralelos entre esses dois lados, que se misturam de maneira inusitada, quando um dos Ki-taek consegue emprego na casa dos Park como professor particular de inglês da filha mais velha.
“Parasita” pode ser pensado como uma tragicomédia com toques de suspense, que fazem o espectador prender a respiração em alguns momentos, rir em outros e sensibilizar-se com a dura realidade dos Ki-taek. Eles sobrevivem de seus pequenos golpes e bicos, e quando seu primogênito entra para o quadro de funcionários dos Park, todos enxergam a chance do grande golpe que pode mudar suas vidas e melhorar sua situação econômica. E o riso do espectador transforma-se em depressão e tristeza com a evolução do filme, que também faz uma dura crítica ao capitalismo e aos preconceitos sutis na convivência entre duas classes extremas.
Joon-ho Bong consegue manipular a audiência com suas locações absolutamente opostas: a casa dos Park, aberta, cheia de luz e espaços vazios e decoração limpa contrasta com a moradia claustrofóbica dos Ki-taek – um porão sujo e quente abaixo do nível da rua, na periferia da capital sul-coreana, em uma rua frequentada por tipos como o bêbado recorrente e todo o lixo depositado na porta. São várias as cenas que passeiam pelas mudanças de paisagens de Seul, trazendo consigo as viradas da narrativa. Essa escolha traz à tona a síntese de todos os paralelismos propostos por Bong: o sobe-desce ao longo do filme mostra uma gangorra da luta de classes, recheado de pequenas sutilezas e grandes exageros.
Por outro lado, o espectador brasileiro em particular pode sentir uma certa aderência maior às ideias de Joon-ho Bong, já que o “jeitinho brasileiro” e o “jeitinho” dos Ki-taek apresentam semelhanças quase que gritantes, ao passo que os preconceitos velados dos Park assemelham-se amplamente com as ressalvas de classes mais altas brasileiras em relação às “pessoas diferenciadas”. Talvez por isso no país o filme esteja fazendo tanto sucesso também: é uma série de mensagens com as quais já estamos familiarizados.
A trilha sonora ajuda – e muito – a posicionar a narrativa e personagens. Duas músicas em italiano merecem destaque “In Ginnochio Da Te” e “Rodelinda: Act 2 – Spietati, io vi glurai” dão os contornos de comédia e esperança, enquanto o restante da trilha original, assinada por Jung Jaeli, trazem todo o peso do crescente drama e seus toques de thriller incorporados por Bong ao longo da história.
“Parasita” não brinca com o espectador e não traz pegadinhas, mas promove uma reflexão constante dos conceitos de honestidade, preconceito, luta de classes, medos, desprezo, empatia e ambição. É o óbvio sem ser óbvio, o que é difícil de traduzir em um longa-metragem de pouco mais de duas horas. Você começa rindo e termina com um misto de choro com um soco na boca do estômago. Vale cada uma das seis indicações da Academia!