[Aviso: Não contém spoilers, só foge do protocolo de não exprimir opiniões diretas]
A loucura, a insanidade, o ponto de ruptura que separa o são do psicótico sempre foram temas dos filmes de Darren Aronofsky. Para ele, o “assistir ao filme” não basta. É quase uma obrigação dele para com o público provocar, fazer e trazer perplexidade aos espectadores. Ele é sempre o mais próximo em nosso tempo de um seguidor da escola Stanley Kubrick de se fazer cinema.
Em “Mãe”, seu sétimo longa-metragem, Aronofsky fez uma (super)dosagem de seu estilo para compor sua história. Esse desafio resultou em um racha entre críticos, a quem ele afirma que não se importa com as diferentes opiniões sobre este filme. “O filme representa um soco, e nem todo mundo gosta de receber um soco”, disse ele em uma entrevista.
(Confira a crítica de Talita Cruz)
É verdade. “Mãe” é um soco. Uma pancada forte. Daquelas que, na mitologia, fez sangrar a cabeça de Zeus e nascer Atena. Como uma pancada, “Mãe” deixa grogue, desorientado, faz quem o vê quase desentender o que está havendo naquele universo que o cerca e como chegamos até aquele ponto. Quem vê escolhe o que fazer depois com aquela overdose (que já foi tratada, inclusive em “Réquiem para um Sonho”) de Aronofsky que se recebe.
O filme mostra um casal em seu local, vivendo sozinhos em aparente paz. Ele (Javier Bardem), um escritor em aparente bloqueio criativo. Ela (Jennifer Lawrence), uma dedicada esposa, focada em reformar a casa. A aparente paz começa a sofrer ruídos quando chega um desconhecido naquela casa (Ed Harris). Misterioso, mas precisando de ajuda, o marido não consegue mandá-lo embora e aceita a estadia dele numa noite. O que deveria durar um momento acaba por tornar-se uma sequência de fatos que vai ficando mais e mais estranha, com uma situação desencadeando outra e atraindo mais pessoas para aquele lugar. Essa invasão é o fio condutor de uma história, carregada no olhar e no desconforto da personagem de Jennifer Lawrence para o filme, com uma maquiagem que a deixou com um semblante bizarramente pacífico no começo do filme (quase que de cera, por assim dizer), mas que serve como base para marcar o desenrolar dos eventos.
A partir daí, NADA mais se pode contar da história do filme. Por ser ruim? Boa? Não. Por ser GENIAL. E como todo filme genial, ele entrega uma história que pode ser discutida e interpretada das mais diversas formas. Assim como não se pode ter uma boa experiência de “O Sexto Sentido” quando já se sabe o fim, não se pode contar mais NADA sobre “Mãe!” sem manchar o grande prazer do filme: A abertura para as mais diversas interpretações. O longa abre espaço para devanear sobre crises internas, sobre família, sobre distúrbios sociais, vida, universo, religiosidade, natureza… Sobre o que o espectador decidir sentir. Sobre tudo e sobre nada até.
E em todos eles, você se sente como em uma montanha-russa, onde se sobe lentamente sabendo que algo virá, e depois se desce em uma descarga de adrenalina maluca. O quarto final do filme é chocante em qualquer viés que se quiser seguir, e é de se pensar o porquê daquilo tudo. Não se espera que um filme tão aberto agrade a todos. Aronofsky consegue em “Mãe!” fazer uma miscelânea de vários de seus “sabores” anteriores. A paixão demonstrada em “A Fonte da Vida” e “O Lutador”; o começo da loucura em “Pi”… tudo conduzindo para a catarse dos personagens de “Cisne Negro” e “Noé”. Essa mescla de tudo que ele fez antes ganhou requintes de terror como em “Réquiem para um Sonho”, mas não olhando só para dentro de si. O universo de personagens criados aqui geram medos e tensões tal qual “O Bebê de Rosemary” (1968) ou “O Iluminado” (1980), onde se sente que algo pode acontecer, só não sabemos o quê. E o que vem a acontecer, é tudo que bagunça e choca aos mais diferenciados públicos.
No fim de “Mãe!”, não importa mais se você dá 1 ou 10 estrela para o que viu, mas a jornada posterior que te faz ficar horas a fio com as imagens na cabeça, tentando buscar dentro de si as próprias explicações, porque a genialidade de Aronofsky reside nisso: Consiste em provocar emoções, sejam quais forem, e não em ser agradável para todos.
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