“Soul”: A Pixar está fazendo animações para adulto?
Nova animação do estúdio toca numa complexidade nunca vista, mas… quem disse que não é pra criança?
Assisti “Soul” com Josi Lima pouco antes de entrar 2021. Uma animação leve, gostosa, pra um tema beem inusitado: Pós-morte e propósito da vida. Ela, não muito religiosa, terminou o filme chorando e dizendo: ISSO NÃO É UM FILME PRA CRIANÇA, GENTE!
A animação da Disney/Pixar conta a história de um professor de música, apaixonado por Jazz e Soul (Jamie Foxx), que morre pouco antes de ter a chance de tocar com uma famosa musicista, onde ele acreditava ser a grande virada da sua vida. Num plano diferente do nosso, ele busca uma forma de voltar para seu corpo, enquanto vira um “instrutor” de uma alminha (Tina Fey) que não vê graça em ir para a Terra.
Complexidade importante
Não foi só Josi que entendeu o filme como uma temática adulta. Vi vários comentários internet adentro que tocavam em como a Pixar saiu de brinquedos falantes em “Toy Story” (1995) até chegar em existencialismo de “Soul” em 2020. Tudo isso é verdade, mas é muito mais.
Soul fala de propósito. De ter vontade de viver. E não é o propósito que dá vontade de viver, mas o contrário.
A animação de 1h41m usa boa parte do tempo ensinando como é bonito o mundo que nos cerca, e convidando a apreciá-lo. É a partir dessa apreciação do universo que nos cerca que vamos, DEPOIS, atrás de um propósito. É sobre primeiro amar viver pra depois depositar essa felicidade em algo que estamos fazendo.
É pra adulto?
E se isso lhe parece complexo de explicar para uma criança, talvez seja porque não é necessário explicar. As crianças tem outras imersões com a vida que as cercam, e somos nós, os crescidos, que nos perdemos nas frustações e desesperos. “Soul” é o ápice da filosofia nos filmes do estúdio, mas não é de agora que estamos vendo isso. Como o querido Filippo Pitanga comentou em uma matéria dele, nós já vemos discussões complexas na Disney desde “Up – Altas Aventuras” (2009), que é uma aventura entre um senhor e um escoteiro para as crianças, mas também é um homem trabalhando um processo de luto após perder a esposa para os mais crescidos.
Nos dois casos, aassinatura é de Pete Docter, roteirista e diretor da Pixar, que parece gostar de trazer essas camadas filosóficas para a tela: Além de “Up”, ele também é o diretor de “Divertida Mente” (2015), que é uma aula de ciência sobre como nossos sentimentos funcionam. No fundo, ele marca um novo gol em ‘Soul’ fazendo o que a Pixar sempre fez com nossas cabeças: Aquecer o coração, animando o que era inanimável até então.
Soul é pra adulto sim, e que bom que é. Além dos lindos traços (principalmente no plano da ‘escola da vida’), é uma complexidade boa de se trabalhar. Porque quem precisa lembrar de viver são os grandões, que lamuriam pelo dinheiro de ir para o cinema, não os pequenos, que já sabem que um filme às vezes é tudo que se precisa pra dar prazer em sentir-se vivo.